Tributação em derivativo eleva custo de hedge
2 de abril de 2015Em 2011, o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, bradava os riscos da “guerra cambial” e lançou mão de uma poderosa arma de seu arsenal. Resolveu taxar quem apostasse na valorização do real via contratos futuros. Críticas não faltaram sobre como tal instrumento poderia desestruturar o mercado e promover distorções de preço e má alocação de capital. O que era uma percepção empírica ganha agora comprovação científica com estudo publicado por pesquisadores do Banco Central (BC).
O trabalho é pioneiro e se dispôs a avaliar se o aumento do custo da operação com derivativos de balcão é transferido para o setor não financeiro. O estudo aponta que quem pagou a conta da taxação imposta contra os especuladores foi o lado produtivo da economia, que viu o custo de fazer hedge (proteção contra variação cambial) mais que dobrar. “Os resultados indicam que este custo [de hedge] mais do que duplicou para as empresas expostas à desvalorização da moeda local, por exemplo, os importadores”, escrevem os autores.
Para chegar a tal conclusão, os pesquisadores compararam o spread entre o contrato a termo ou NDF (non-deliverable forward, derivativo de balcão pactuado entre as partes e intermediado por alguma instituição financeira) e o contrato de câmbio futuro negociado em bolsa de valores antes e depois que a posição vendida passou a pagar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em agosto de 2011.
Pelos dados compilados, o custo para as empresas não financeiras se protegerem da variação cambial subiu entre 50% a 185%, dependendo do modelo adotado para a avaliação. Quem busca proteção cambial pode ir direto à bolsa comprar contratos futuros ou optar por um NDF, que pode ser feito conforme prazos e demais necessidades do contratante.
O trabalho para discussão 379, “OTC Derivatives: Impacts of Regulatory Changes in the NonFinancial Sector”, ou Derivativos de Balcão: Impacto de mudanças regulatórias no setor não financeiro está disponível no site do BC. Os autores são Gustavo Silva Araújo, do Departamento de Estudos e Pesquisas (Depep), e Sérgio Leão, do Departamento de Operações do Mercado Aberto (Demab). A visão exposta não necessariamente reflete a posição do BC.
Um spread maior entre os dois mercados depois da adoção na nova tributação aponta que os bancos repassaram ao menos parte desse custo regulatório para as empresas.
“Esse aumento de custo é preocupante, pois pode impedir que as empresas façam hedge de suas posições, ficando mais vulneráveis a choques na taxa de câmbio”, diz o estudo, lembrando que o custo do NDF já é mais elevado no Brasil e em outros mercados emergentes em função do grande diferencial entre os juros locais e externos. O IOF sobre posição vendida foi retirado em junho de 2013.
Ainda de acordo com os autores, embora tão eficaz em conter a entrada excessiva de moeda estrangeira quanto medidas macro-prudenciais e controle de capitais, a tributação sobre as posições vendidas tem esse efeito colateral de encarecer o hedge.
O trabalho também se encaixa em discussão internacional sobre a imposição de maior regulação para operações com derivativos, principalmente os de balcão, assunto que está em pauta desde a crise de 2008. Na visão dos pesquisadores do BC, a comunidade internacional também deve levar em conta nas discussões sobre maior segurança e transparência o “trade-off” entre aumento de regulação e maiores custos, conforme demonstrado pelo trabalho.
A amostra abrange 5.172 contratos de NDF de real versus dólar entre abril de 2011 e fevereiro de 2012. O universo de participantes foi de 999 empresas e 34 bancos. Entre as empresas, 354 só fazem posição vendida, 502 apenas posição comprada e 143 atuam nas duas direções. O estudo também aponta que esse é um mercado dominado pelos bancos estrangeiros, que responderam por 57% dos NDFs e por 67% do volume. Os bancos públicos responderam por apenas 6% dos contratos estudados.
Fonte: http://www.valor.com.br/financas/3989014/tributacao-em-derivativo-eleva-custo-de-hedge