A relação de consumo e o inciso III, do artigo 4º da lei de proteção ao consumidor
21 de julho de 2009A RELAÇÃO DE CONSUMO E O INCISO III, DO ARTIGO 4º DA LEI DE PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR
O mercado de consumo brasileiro, setorizado, com seus amplos altos e baixos, encontrou na Lei federal n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, o conhecido Código de Defesa e Proteção do Consumidor, uma referência do proceder. De um lado, consumidores que conheceram um porto seguro e, de outro, pessoas naturais ou jurídicas, públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de comércio, produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços que ainda procuram um modo eficiente de continuarem a exercer suas atividades dentro do rígido sistema legal da mencionada Lei.
Eficiente porque buscam uma maneira segura para agirem de modo equilibrado frente a generalidade da Lei e seu espírito de proteção, somados as constantes criações de ações para regular e regulamentar o mercado de consumo, leia-se: ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor; criação e desenvolvimento de associações representativas; presença do Estado no mercado de consumo.
Estes fatos têm tornado o dia a dia do consumo um prato cheio para inúmeras associações de defesa do consumidor, órgãos privados e públicos exercerem atividades de fiscalização nos fornecedores ou promoverem judicialmente contra aqueles a defesa do consumidor. Mais e mais, a cada dia, num vertiginoso crescente, os diversos setores produtivos da sociedade têm sentido o peso das fiscalizações e ações que, sob o manto alegada defesa do consumidor, chega a colocá-los em risco. É a farra do bis in idem.[1]
Se à mulher de César não bastava ser honesta, tinha que deixar transparecer tal qualidade. Aqui a mesma coisa. Apesar de legal, chegamos a um ponto tal que o desequilíbrio gerado, na grande maioria dos casos, beira a desonestidade do propósito. O equilíbrio das relações jurídicas visado por qualquer Lei, desapareceu!
Por exemplo, um mesmo fato tido como ilícito ocorrido em um determinado setor, pode ser alvo de fiscalização e autuação[2] por parte de diversos órgãos: – PROCON’s, DECON’s, INMETRO, Vigilâncias Sanitárias estaduais, municipais, MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, órgãos ligados ao Ministério da Saúde etc.
Encontramos na Lei federal n. 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Lei que dispõe sobre a proteção ao consumidor, no seu capítulo II – “Da Política Nacional de Relações de Consumo”, no seu artigo 4º que: “A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios”[3], e que no seu inciso III, diz: “harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”.
Tal dispositivo tem sido atendido mais pelos fornecedores e consumidores do que propriamente o poder público e as ditas organizações de defesa do consumidor.
Tomemos por exemplo as reclamações no PROCON-SP. Veja-se a quantidade total de reclamações fundamentas no ano de 2007: 515.681 (100%). Atendidas foram 14.359 (63%). Não atendidas 8.472 (37%).
Desse total, a categoria ALIMENTOS ocupou a quantidade de 1.856 reclamações (0,36%); e, PRODUTOS 154.601 (29,98%), das quais, foram atendidas – alimentos 1.134 (0,22%) e produtos 135.830 (26,34%).
Se somarmos as autuações relativas ao setor supermercadista – varejo, teremos um total de 142 reclamações. Isto equivale a 0,0275% do total de reclamações havidas. Atendidas foram 67 (0,0130%) e não atendidas 75 (0,0145%).
Agora, se perguntarmos as redes do varejo desse setor, certamente tiveram mais autuações do que a quantidade de reclamações feitas pelos consumidores.
É a farra do bis in idem que continua. Ao que parece, mais por culpa do poder público do que dos pobres mortais da iniciativa privada.
[1] O bis in idem, embora injusto e antieconômico, não se tem proibido por lei.
[2] Processo sancionatório é um processo administrativo pelo qual são apuradas infrações às normas de defesa do consumidor e que, se confirmada a existência da infração, resulta na aplicação de penalidades ao fornecedor.
[3] Redação dada pela Lei n.º 9.008, de 21.3.1995.