DECISÕES PODEM SER CANCELADAS, SE COMPROVADA FRAUDE
9 de abril de 2015Decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) somente poderão ser anuladas se for comprovada fraude. Não há, porém, um consenso entre especialistas se a medida pode ser aplicada pelo próprio órgão ou se seria obrigatório passar pelo crivo do Judiciário. Há ainda, a discussão se os processos já finalizados no Carf podem ser revistos, se já estiverem prescritos. As dúvidas, por si só, demonstram que serão necessários anos de debate para finalizar uma possível discussão sobre a nulidade dessas decisões.
Caso a Operação Zelotes comprove a existência do pagamento de propina a conselheiros do órgão, há dois possíveis cenários, de acordo com juristas. Uma corrente entende que a legislação federal (dentre elas a Lei nº 9.784, de 1999), acrescida do regimento interno do Carf, permite a nulidade administrativa e rejulgamento do processo com vício. A legislação federal prevê que a administração pública pode rever atos que estejam “eivados de vícios”. O caso de corrupção pode se enquadrar nessa hipótese.
A outra corrente entende que a revisão pode ocorrer somente por uma ação judicial anulatória, proposta pelo Ministério Público Federal, pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ou pelo próprio contribuinte. Especialistas alertam, porém, que cancelar um julgamento do Carf não significa que a nova decisão será obrigatoriamente diferente. A empresa, antes vencedora, pode sair derrotada com tributos, multa e correção monetária a pagar. E a que antes perdeu a discussão no Carf pode se livrar da autuação fiscal.
“Ainda que tenha ocorrido fraude, em uma possível revisão, o contribuinte poderá ganhar o mérito da discussão”, afirma …
… afirma que uma decisão administrativa pode ser anulada, mas é preciso haver provas para caracterizar que houve o vício. O vício pode ser a comprovação de compra de votos ou de que um conselheiro impedido julgou a questão. O regimento interno do Carf proíbe por “impedimento” o julgamento de processos de parentes, quando há interesse econômico na causa, ou se foi o próprio conselheiro quem autuou o contribuinte.
Além disso, segundo ele, se a decisão já estiver finalizada no Carf, uma possível reversão somente poderia ocorrer no Judiciário. “Porém, as poucas vezes que se tentou fazer isso, não houve sucesso”, diz. Em 2003, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu manter decisão do Carf questionada pela Fazenda contra decisão administrativa que favoreceu o CCF Fundo de Pensão. Em 2013, mais de 50 ações populares foram propostas por uma advogada contra decisões do Carf e todas foram negadas na primeira instância por não ter sido comprovado vício.
… também entende que o meio de discussão do vício do julgamento seria uma ação anulatória que somente poderia ser discutida perante o Judiciário. Em caso de nulidade, segundo ele, o julgamento não voltaria para o Carf e a Justiça avaliaria o mérito.
O pedido de anulação pode ser feito pelo Fisco ou pelo contribuinte. O Bradesco, por exemplo, pode pedir a nulidade da decisão do Carf, que o condenou em R$ 1,5 bilhão, se comprovar que o julgamento foi desfavorável em razão da negativa à propina. Da mesma maneira, o Fisco pode pedir a revisão da decisão que livrou a Gerdau de uma autuação de R$ 800 milhões, se demonstrar que um dos conselheiros do caso foi corrompido.
Atualmente, há 11.963 processos do Carf em estoque, que discutem autuações fiscais e somam mais de R$ 536 bilhões. Somente acima de R$ 100 milhões, há 780 processos, cujo valor global corresponde a R$ 357 bilhões. De janeiro a fevereiro do ano passado, entraram 59.725 processos, que correspondem a R$ 526,8 bilhões, e foram proferidos 36.443 acórdãos que equivalem a R$ 391,2 bilhões. De acordo com as investigações da Operação Zelotes – sobre o pagamento de propinas -, há 74 autuações que envolvem 60 empresas e somam R$ 19 bilhões sob análise.
Fonte: http://www.valor.com.br/brasil/3998338/decisoes-podem-ser-canceladas-se-comprovada-fraude