MUDANÇAS NA LEI DE ARBITRAGEM PROVOCAM DEBATES EM SOCIEDADES ANÔNIMAS
29 de julho de 2015As mudanças efetivadas na Lei de Arbitragem recuperaram as discussões que envolvem a utilização desse meio alternativo de conflitos nas disputas societárias, marcadamente nas sociedades por ações. Foi incluído um dispositivo na Lei das S.A. tratando da deliberação dos acionistas sobre a inserção de convenção de arbitragem no estatuto social das companhias.
Quando essa decisão for tomada, no sentido de fazer constar no estatuto social que os conflitos societários serão resolvidos por procedimento arbitral, os acionistas que não concordarem terão o direito de se retirar da companhia.
Esse direito de retirada não é absoluto. Há duas exceções, a saber: no caso de companhia cujas ações tenham liquidez no mercado – o que é compreensível, pois o acionista descontente poderá vender suas ações na bolsa. E no caso de a companhia inserir a arbitragem no seu estatuto social para ingressar em segmento de listagem na bolsa, como o novo mercado. Exatamente essa segundo exceção é que reascende as discussões sobre a arbitragem nos conflitos societários de sociedade por ações.
Em primeiro lugar, analisa-se o grau de obrigatoriedade de uma cláusula estatutária com esse teor, tendo em vista que restringe o direito de atuação do acionista que venha a se sentir prejudicado por qualquer razão. Esse acionista somente poderá buscar a pretensão que entende ter por meio do procedimento arbitral. Acontece que ele pode não ter concordado com essa deliberação da assembleia.
Depois, avalia-se a posição de um investidor que venha a se tornar acionistas da companhia posteriormente à deliberação de inserir a convenção arbitral no estatuto. Argumenta-se, então, que ao adquirir as ações, esse investidor estaria aderindo a todas as cláusulas estatutárias, o que inclui, naturalmente, aquela que determina que os conflitos societários serão resolvidos por meio da arbitragem. Ainda que essa escolha ao meio alternativo de solução de conflitos, e a consequente renúncia ao direito de recorrer ao Poder Judiciário, deva ser espontânea, a compra das ações demonstraria, de maneira cabal, essa vontade do investidor.
Por outro lado, há quem sustente que a adesão à convenção arbitral deveria ser expressa, requisito essencial para a espontaneidade da escolha pela arbitragem. Em assim sendo, quando adquirisse ações de uma companhia que tivesse a convenção arbitral no seu estatuto social, ao investidor – agora acionista – deveria ser apresentada a opção por aderir ou não à cláusula arbitral.
Em caso negativo, poderia esse acionista em particular buscar o Poder Judiciário para resolver eventual conflito societário de que tome parte, gerando, potencialmente, uma situação de desigualdade entre os acionistas – os que teriam aderido à cláusula arbitral, renunciando o direito à medida judicial, e os que não o fizeram, preservando o acesso ao Judiciário.
Por fim, há ainda a posição de que as companhias abertas não poderiam se valer da arbitragem para conflitos societários. Esse entendimento baseia-se em dois argumentos. Por se tratar de empresa dada à publicidade (“public companies” no termo em inglês), as suas desavenças não poderiam ser protegidas pelo sigilo do procedimento arbitral. Além disso, as soluções deveriam ser idênticas para conflitos idênticos, com o intuito de preservar a igualdade das situações de acionistas, o que não pode ser assegurado pela arbitragem.
Pode-se ainda entender que, dada a natureza das sociedades por ações de capital aberto, as relações entre os acionistas e entre eles e a própria companhia teriam a natureza de direito coletivo. Se assim for, questiona-se a disponibilidade desses direitos. Portanto, não sendo direitos patrimoniais disponíveis, a arbitragem estaria vedada por lei, independentemente da manifestação expressa e espontânea das partes envolvidas.
É sabido que um dos componentes do chamado custo Brasil é a insegurança jurídica. As discussões sobre a arbitragem nas sociedades por ações só fazem crescer essa insegurança, sendo necessária uma definição sobre o assunto. Diante disso, qualquer que seja a solução definitiva, a preocupação deveria ser garantir a previsibilidade da decisão dos conflitos.
Fonte: http://www.valor.com.br/legislacao/fio-da-meada/4152486/mudancas-na-lei-de-arbitragem-provocam-debates-em-sociedades-anonima